Blog do Torero

Arquivo : January 2011

Férias!
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Torero

Caros leitores, caríssimas leitoras, vou entrar em férias.

Mas não serão férias simples. Serão férias de um ano. Sim, um ano!

Tenho certeza que uns ficaram com inveja, outros lamentaram minha ausência e uns outros pensaram “Só um ano?, que pena…”.

É claro que estes doze meses podem ser mais ou menos, mas o combinado com o UOL foi um ano.

O motivo é que tenho ideias de algumas coisas para escrever mas, se continuar com este blog e com o do Lelê, não conseguirei colocá-las no papel. Ou, no caso, na tela do computador.

Fazer este blog é muito divertido e, por conta disso, em vez de trabalhar dois dias, como está no meu contrato, acabo trabalhando os sete dias da semana, inclusive aos domingos, como este. E nem conseguiria fazer diferente. Por sua culpa. É, sua!

Juntei aqui uma turma tão inteligente e bem humorada (com exceções que servem de tempero) que me sentiria culpado se não escrevesse com assiduidade. Não tenho dúvida de que tenho os melhores leitores do UOL. Tanto que juntos fizemos ótimas coisas, como a Copa dos Pesadelos e algumas reportagens, como “Qual a maior loucura que você já fez pelo seu time?”

Por isso, há uns quatro anos, todo dia acordo pensando sobre o que vou escrever no blog.

Mas agora me deu a curiosidade de saber o que escreverei se não tiver que escrever. Como será acordar sabendo que vou escrever algo menos imediato, que não será lido depois de alguns minutos na internet? Em que pensarei se pensar menos em futebol? Conseguirei fazer um romance em menos de um ano (o último levou mais de três)? Conseguirei escrever aquela peça sobre Marx e Engels?

Será a primeira vez, desde dezembro de 1994, que não terei um emprego fixo para escrever. Naquele tempo comecei uma coluna no Jornal da Tarde, depois passei para a Folha de S.Paulo, ao mesmo tempo escrevi roteiros para a Globo, e agora estou cá no UOL. São quinze anos em que tive a sorte de receber salários pela minha escrita. Mas agora quero saber o que escreverei se só tiver a mim mesmo para obedecer.

A sensação é como pular no precipício. Conseguirei voar? Acionarei um pára-quedas? Vou me estatelar no chão? De qualquer forma, vou sentir um ventinho gostoso.

Amanhã, quando acordar, será a primeira segunda-feira em muitos anos em que não comprarei um jornal, irei para o bar perto de casa com uma caneta e ficarei anotando ideias para o texto. Vai ser interessante.

Mas não pensem que vocês ficarão totalmente livres de mim. Em março ou abril estréia uma série nas tevês Cultura e TV Sesc (Somos 1 Só), já começaram as filmagens da série FDP, que será exibida pela HBO, há a história de Kubno e Velva, que continua até abril, uma série no UOL Sexo e três livrinhos sairão no primeiro semestre.

Por fim, se a saudade apertar, sempre posso colocar alguma coisa cá no blog. Por exemplo, uma crítica, um aviso de lançamento de livro ou um texto sobre a goleada do Santos sobre o Corinthians na final da Libertadores.

Até breve, Torero.


A religião, o futebol e os tabus
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Torero

Marcus Vinicius Batista

            O templo ficava atrás de uma concessionária. Quando se busca a paz, o lugar não importa, até porque em ambos os endereços pagavam-se religiosamente todos os meses para viver o equilíbrio espiritual.

            O culto era realizado aos sábados, sempre às dez da manhã, com sol, chuva, frio ou feriado. Eram cerca de 25 homens fiéis, todos frustrados de alguma forma porque não alcançaram os sonhos de criança.

           Naquele espaço, uma vez por semana, alguns deles se aproximavam do paraíso. Outros pagavam seus pecados. Poucos atingiam o grau de redenção.

            O paraíso tinha comprimento e altura. Cinco metros por dois, mais ou menos. Ali, uma vez por semana, eu era o Judas, o traidor, o milagreiro às avessas. Um goleiro, aquele sujeito nascido para matar a beleza da religião, impedir a comunhão do gol.

            Como autor, dou-me o direito de ser parcial e filtrar os rumos da micro-história do templo verde sintético. Se tivesse que me confessar, diria apenas que sou um bom goleiro de time de bairro, o que me parece suficiente para um campo de futebol society. De bairro.

            Um sábado transformou-se o ritual em tabu. Por circunstâncias de sorteio (na verdade, a escolha é autoritária a partir de qualidade técnica), eu e um amigo, volante nas horas vagas, sempre caiamos no mesmo time. Ele nunca era um dos primeiros a serem escolhidos. Também não era dos últimos, o que indicava o desempenho mediano ao olhar alheio.

             A escolha era sábia: o volante carregava o piano à moda antiga. Pouca presença no ataque, vontade de vencer (o que significava dividir com/e os adversários), além de preparo físico invejável (qualidade em uma partida de barrigudos).

            Pouco me lembro destes jogos. Era só a válvula de escape das pessoas comuns. Reconheço que guardei com mais clareza as conversas antes e depois das partidas. Diálogos sobre literatura, escritores, cinema e crônicas.

           Cinco anos depois, o amigo-volante puxou papo sobre as missas aos sábados. Pensei que falaria sobre as conversas. Foi direto ao ponto: o dia que o céu fechou as portas para ele. O sábado em que quase fez um gol. Ele recitava o lance como o evangelho que escapa aos lábios de um narrador de rádio AM em tarde de clássico.

           A narração era tão precisa, tão detalhada que me senti em um daqueles filmes do Canal 100. O volante desceu pela direita, livrou-se do zagueiro adversário em velocidade e disparou o chute. A bola seguiu rasteira, com endereço certo no canto esquerdo do goleiro. Não me lembro, mas ele me disse que espalmei por milagre. A bola foi para escanteio.

           A história bastou para cicatrizar o tabu. Nunca tomei gols deste volante. Em cinco anos, apenas uma partida. Jogamos do mesmo lado, no mesmo campo atrás da concessionária, em Santos. Era um jogo amistoso entre o time do society, o Banguzinho, e um apanhado de escritores e jornalistas, que participavam de uma feira literária.

           Como jornalista, engrossei o coro dos literatos pernas-de-pau. Como escritores mais tagarelam sobre futebol do que o colocam em prática, o volante se transformou em um aguerrido meia.

            De nome José Roberto, o novo volante moderno, despediu-se do campo com honras, em seu último sábado. De sobrenome Torero, o volante de ligação manteve a virgindade, sofreu como um crucificado, mas resistiu à tentação de sacrificar seu próprio goleiro com um gol contra.

            Decidi não compartilhar a mesma camisa com ele na próxima pelada. Torero sabe que mais gostoso do que manter um tabu é quebrá-lo.


Craque com R
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Torero

Filipe Molina

 Outro dia me peguei pensando em um jogador brasileiro. O problema é que não consegui lembrar o nome dele. Será que alguém consegue me ajudar?

Ele surgiu no Brasil nos anos 90, e logo de cara foi dado como promessa. Rapidamente, devido sua habilidade, passou de promessa para realidade.
Já realidade, saiu do Brasil passou por um clube europeu de menor expressão e depois chegou ao Barcelona. Na cidade catalã ele se tornou craque Mundial e conquistou o prêmio de melhor do mundo da FIFA.

Em seu auge uma dúvida persistia, ele é atacante ou meia-atacante? A pergunta não foi respondida até hoje, mas mesmo assim ele fez miséria na ponta-esquerda, principalmente no Camp Nou. Lá ele fez gols de bicicleta, falta, driblando o goleiro, entre outras maravilhas.

Na seleção ele não repetia as grandes exibições como em seu clube. Mesmo assim conseguiu ser campeão em uma Copa e ser derrotado pela França em outra.

Talvez, por não ser unanimidade na seleção com o tempo ele foi perdendo seu espaço durante as eliminatórias da Copa. No Barcelona ele também perdeu espaço após desentendimentos com um treinador holandês.

Acabou se transferindo para o Milan e também não se firmou como titular e acabou ficando na reserva. Tanto no clube catalão como na seleção ele ostentou a camisa de número dez. Porém em sua passagem pelo clube italiano o número foi outro.

O Brasil, país em que ele está envolvido com administração de um clube na cidade em que nasceu para o futebol, foi o lugar escolhido para jogar após passagem frustrante no Milan. Porém o clube escolhido foi um que não tinha ligação anterior.

Me lembrei de uma coisa: o nome dele começa com a letra R, se não me engano é Rivaldo. Ou seria Ronaldinho?


Três livros: dois de um e um de dois.
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Torero

  Vou começar pelo um de dois, que é um livro de dois autores.  “Ponte Preta, a torcida que tem um time”, de André Pécora e Stephan Campineiro, é um respeitável livro de mais de seiscentas páginas. O número pode assustar, mas, afinal de contas, são 110 anos de história. E, graças a uma escrita fluente, a uma boa divisão de capítulos e a uma boa diagramação, a leitura não pesa.  É um livro bem editado (pela Pontes, editora que nasceu da maior livraria de futebol do país, a Pontes, de Campinas, que não tem este nome por conta do clube ou do bairro, mas sim por causa de seu proprietário José Reinaldo Pontes), com páginas num suave tom amarelinho, fotos, boa diagramação, entrelinhamento generoso, etc…

“Ponte Preta,a torcida que tem um time”, conta desde coisas tradicionais nos livros sobre clubes, como a fundação e a construção do estádio, até histórias mais curiosas, como o nascimento da faixa da camisa e a ligação do clube com o anarquismo. Há também biografias futebolísticas dos principais jogadores passaram pela Ponte. Alguns são craques nacionalmente conhecidos, como Dicá e Carlos, outros são famosos apenas para os torcedores do clube (estes geralmente têm as melhores histórias), como Bruninho, Pitico e Ciasca, o goleiro que operava milagres e entendia de ópera (curiosamente, vi este livro na casa de Zé Cabala e ele estava aberto justamente no capítulo sobre Ciasca). E ainda há, claro, um capítulo especial sobre o Dérbi, o maior clássico do interior do país, e que este ano acontecerá na Série B do Brasileiro.

  O primeiro de um é este Timbuktu. E o um é Paul Auster, um autor que não está na minha Série A mas é bem interessante. O livro conta a história de um cão com nome de gente, Mr. Bones, e seu dono com nome de cachorro, Willy, que é uma mistura de artista com homem de rua.

Não é um daqueles livros fofos sobre cachorros. Está mais para pulga do que para lacinho cor de rosa. Demorei um bom tanto para lê-lo. Não é uma daquelas obras em que seus olhos voam pelas linhas e você acorda de manhã já pensando em como serão as próximas páginas. Li o outro livro do mesmo autor com muito mais gosto.

Invisível tem uma estrutura bem interessante. Ele é dividido em quatro partes, e cada parte a narração se afasta do personagem principal. Mas se afasta em relação à feitura, não em relação ao personaghem. Explico. É que a primeira parte é narrada em primeira pessoa, o jovem Adam Walker. A segunda é escrita em terceira pessoa para Adam Walker. A terceira é feita por um escritor a partir de anotações de Adam Walker. E a quarta é contada por uma pessoa que conheceu nosso personagem.

A estrutura é interessante e a história, idem. Ela conta a vida de Adam, um estudante e candidato a escritor de uns vinte anos, e seu encontro com Rudolf Born, de quem não falo nada aqui para não estragar a leitura. Para atiçar, só digo que há amores bem descritos e um assassinato. Li as 270 páginas em uns cinco dias, o que é uma prova de que o livro é agradável. Pelo menos para mim.


Afaste-se das feijoadas
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Torero

(No Velharias de hoje, um textinho sobre coisas que nos deixam louco)

Luana Piovani, Ana Paula Arósio, feijoada e futebol podem ser os quatro itens mais desejados pelos brasileiros, mas sua combinação pode ser triste, caro leitor. Leia estas linhas e entenderá o porquê.

Tudo começou num boteco onde eu comia uns bolinhos de bacalhau com Luana e Ana Paula. Obviamente, eu estava sem jeito, sem saber onde pôr as mãos -ou talvez soubesse, mas não pudesse. De qualquer forma, o fato é que eu não sabia o que dizer para as musas da telefonia.

Como a única coisa da qual entendo um pouco é futebol, resolvi contar alguns casos lendários da história de nosso esporte.

Para começar, disse que uma vez o Nacional de Manaus teve que perder um jogo para se classificar por renda.

“Por renda?”, perguntou Luana.

“Sim”, eu respondi, “e o Grêmio já teve que perder para continuar num torneio”.

Ela deu uma estriptosa gargalhada. “Você me faz rir! Conte outra!”, pediu.

Obedeci. Falei que em 1987 nós tivemos dois Campeonatos Brasileiros, um vencido pelo Flamengo e outro pelo Sport. E, até hoje, os dois clubes se proclamam donos do mesmo título.

Ana Paula se contorcia de tanto rir. “Você é um gozador!”, ela dizia.

Eu queria ver aqueles dentes de novo, então contei que certa vez o São Paulo teve que jogar no mesmo dia, local e horário por dois campeonatos diferentes.

Como a façanha era impossível, o tricolor antecipou um dos jogos por duas horas e realizou uma rodada dupla.

“Mais, mais!”, implorou Luana.

Seu desejo era uma ordem. Então falei do Fluminense, o único clube no mundo rebaixado da primeira para a segunda divisão por dois anos seguidos.

“Não pare!”, suplicou Ana, enxugando uma lágrima.

Não parei. Disse que o Vasco da Gama conquistou um título por W.O. e que uma vez um de seus jogadores, o atacante Edmundo, foi expulso para poder jogar a próxima partida.

“Nunca ouvi nada mais engraçado”, bradou Luana enquanto dava tapas na mesa.

Empolgado com a idéia de que a noite poderia acabar, digamos, numa linha cruzada, continuei. “”E vocês não sabem da melhor: o Brasil vai abrigar um Campeonato Mundial de Clubes no ano 2000, e os nossos representantes são os campeões da Libertadores e do Brasileiro de 98.”

Elas riram tanto que eu pude ver suas belas amígdalas.

Então, ambas se inclinaram para beijar-me o rosto. Achei o toque de suas peles um tanto áspero, e, quando olhei-as novamente, Luana tinha se transformado em Ricardo Teixeira, e Ana Paula, em Eurico Miranda.

Dei um grito de horror e acordei suando.

Então, lembrei que antes de dormir tinha comido uma feijoada gigantesca. Aquele prato certamente fora o responsável por esse pesadelo que combina os quatro sonhos brasileiros.

Por isso, leitor, é que lhe digo: Afaste-se das feijoadas!


Links legais
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Torero

1-) Aqui você lê o texto “Mercadorias estragadas”, de Marcus Batista, sobre Ronaldinho Gaúcho e outros jogadores que retornam ao Brasil.

2-) Aqui, mais aventuras de Kubno e Velva:


Zé Cabala e Foguinho em volta da fogueira
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Torero

Ontem à noite fui até a casa de Zé Cabala, o supremo correio das almas, o grande facebook dos espíritos.

Fui encontrá-lo em seu quintal. Ele e Gulliver, seu assistente anão, estavam em volta de uma fogueira. Sentei-me entre eles e perguntei:

“Estão fazendo algum ritual xamânico?”

“Acabou o gás e estamos assando salsichas”, respondeu Gulliver.

Só então reparei que havia ali uma grelha improvisada.

O mestre dos mestres retirou um espeto, mordeu a ponta de uma salsicha e disse:

“O que o traz aqui em plena noite de domingo, foliculário?”

“Não houve nenhum jogo interessante e preciso fazer um texto para amanhã de manhã.”

“Isso vai lhe custar uma taxa extra.”

“Quanto?”

“Um botijão de gás.”

“Feito.”

Então o supino sábio levantou-se e começou a dar voltas em torno da fogueira. Começou andando, depois acelerou, e por fim correu como um doido. Depois de algumas voltas, sentou-se esbaforido.

“Bah, tchê, nada como um exerciciozinho. Mas podiam ter me arranjado um corpo melhor.”

“Quem sois vós, oh, ser do além?”

“Foguinho.”

“Foguinho?”

“Bah, já vi que não entendes nada de história de futebol. Já ouviste falar em estilo gaúcho de jogar?”

“Claro.”

“Esse estilo sou eu. Eu que inventei esse negócio de força física, de aplicação tática, de marcação e jogo de conjunto.”

“O senhor? Por quê? Nasceu muito forte?”

“Pelo contrário. Nasci um ruivo bem franzino, daí o meu apelido. Então, no inverno de 1926, quando eu tinha 16 para 17 anos, caí doente. O médico disse que eu era muito fracote e, se continuasse jogando bola, poderia pegar uma tuberculose.”

“O que o senhor fez? Parou com os exercícios?”

“Pelo contrário. Resolvi fui remar no Guaíba e levantar peso para pegar corpo. Deu certo. Com 19 anos eu era um touro! Mas não um touro xucro. Um touro canhoto e com habilidade, que sabia driblar e chutar.”

“Lembra do seu jogo de estréia?”

“O primeiro a gente nunca esquece. Foi contra o Americano, que era o campeão de Porto Alegre. Ganhamos por quatro a dois.”

“E o primeiro campeonato?”

“Foi o da cidade, em 1930. A final foi contra o Cruzeiro. 3 a 1. E eu fiz o terceiro. Naquele tempo, quem ganhava o campeonato da cidade disputava o estadual contra os campeões das outras quatro regiões: Serra, Fronteira, Nordeste e Litoral. E lá fomos nós.”

“Ganharam?”

“Chegamos à decisão contra o Pelotas, do Litoral. O empate dava o título para eles. Mas de cara abrimos dois a zero. Só que o juiz deu dois pênaltis para o Pelotas e o jogo empatou. Depois fiz o terceiro, mas o juiz deu outro pênalti para eles. Aí não agüentei! Dei um bico na bola, fui expulso, teve tapa pra lá, tapa pra cá, o Grêmio saiu de campo e eu tive que fugir do estádio no carro de um dirigente. Mas o pior é que o juiz mandou o Pelotas cobrar o pênalti, mesmo sem adversário, e perdemos o título.”

“Pena, pena…”

“Mas nos vingamos nos dois anos seguintes. Fomos campeões invictos da cidade e do estado.”

O time de 1931. Foguinho é o último e pé, à direita.

“O seu salário deve ter aumentado.”

“Qual o quê? E eu lá era homem de jogar por dinheiro. Jogava por amor ao clube. Já ganhava bem como funcionário das lojas Renner, não precisava de dinheiro do futebol. Tanto que nem aceitei o convite para jogar no Vasco da Gama e no Botafogo.”

“Quantas vezes o senhor foi campeão?”

“Dez. Metropolitano em 30, 31, 32, 33, 35, 37, 38 e 39, e estadual em 31 e 32.”

“Parou de jogar com quantos anos?”

“Trinta e dois. Quase todo mundo parava por aí. Então fui cuidar da minha alfaiataria no centro da cidade. Mas um ano depois decidi voltar ao futebol. Só que como juiz. Apitei durante dez anos, e era tão correto que o Inter sempre queria que eu apitasse os grenais.”

“Isso sim, é prova de honestidade.”

“Em 53, o Cruzeiro me chamou para ser técnico. Hesitei mas topei. E gostei. De lá voltei para o meu Grêmio. Então pude pôr em prática várias coisas, como o esquema tático da Hungria, o esmero na preparação física e a força de conjunto. Em 55 perdemos o título por pouco, mas depois disso ganhamos cinco estaduais seguidos. Só saí em 1961 porque o diretor de futebol quis escalar o meu time. Aí peguei o boné. Se eu ficasse não seria um homem, seria um rato. Mas tudo bem. O importante é que, como jogador e depois como técnico, eu mudei o jeito da minha terra jogar. Hoje, quando falam em estilo gaúcho, sem saber estão falando de mim.”

 

PS: Quando estava saindo da casa de Zé Cabala, vi na prateleira um livro chamado “Os dez mais do Grêmio”, de Marcelo Ferla, e o marcador de página estava justamente na parte que contava a história de Foguinho. O mundo é cheio de coincidências.


A hora da Seleção dos Pesadelos 2010
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Torero

Sem delongas, vamos aos escolhidos pelos leitores do blog. 

O goleiro, apesar do esforço de Bruno, foi Fábio Costa, disputado por Santos e Atlético Mineiro para ver quem não fica com ele. Teve um ano infeliz, mas santistas e corintianos sabem que é um bom goleiro e que, se ficar em forma, há poucos como ele no Brasil.

 O goleiro ainda pode ser um terror para os atacantes.

 Os laterais mais lembrados foram Victor, do Palmeiras, e Juan, agora no São Paulo. O primeiro me parece inseguro; o segundo, confiante demais. Dá no mesmo.

A zaga ficou com André Luiz e Miranda, o primeiro por se empenhar demais, o segundo, de menos.

No meio de campo está o capitão do time dos pesadelos, ninguém menos do que Felipe Melo, o volante de Dunga. Felipe realizou alguns jogos surpreendentes logo que foi convocado, mas, no fim das contas, fez o que todo mundo esperava: perdeu a cabeça.

Felipe Melo, o pesadelo de Júlio César

 Ao seu lado, outro convocado de Dunga: Kléberson. O volante, talvez a convocação mais criticada de Dunga, pois era reserva no próprio clube, ocupou a vaga de um meia e pouco fez este ano.

Falando em meias, para esta posição foram escolhidos dois jogadores que não jogaram metade do que podem: Kaká, que passou o ano machucado e novamente não fez uma boa Copa, e Diego Souza, que brigou com a torcida palmeirense e não encantou a atleticana. Valdívia também foi lembrado.

Será este o problema de Diego Souza?

 Na frente houve uma grande disputa, mas Adriano, do Roma, e Souza, do Corinthians, acabaram merecendo a posição. Na reserva, Val Baiano e Washington, uma dupla especialista em perder gols.

A partida deste grande time seria narrada por Galvão Bueno e comentada por Neto. A dirigente seria Patrícia Amorim

O pior jogo foi Vasco 0 x 0 Palmeiras, em São Januário, que eu, por sorte, não vi.

O pior esportista fora do futebol foi Felipe Massa, que lembrou o Rubinho dos piores anos.

E o esportista mais citado pelos leitores, aquele que se consagrou como o pesadelo de 2010, foi ninguém menos do que W(V)anderley(i) Lux(ch)emburgo, que assim ocupará o cargo de técnico da nossa seleção de horrores. O veterano treinador, que tantas glórias já conseguiu, parece ter desaprendido, e quase rebaixou dois dos times de maior torcida no país.

Luxemburgo não deu sorte com a camisa do Flamengo.

O duelo que foi sem ter sido
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Torero

 Por Marcelo Lyra

Pois é, o esperado duelo ao por do Sol na São Silvestre com meu arqui rival José Roberto Torero acabou não ocorrendo. Primeiro porque estava nublado, mas principalmente pelo motivo mais tosco: apesar de estarmos os dois na mesma rua, armados e prontos para disparar (literalmente), simplesmente nos desencontramos na largada. Ele precisou chegar duas horas antes para encontrar a equipe de filmagens da nossa amiga Lina, que fazia um documentário. Como durmo e acordo tarde, às três horas, enquanto ele era equipado com câmera e microfone, eu equipava meu estômago com o almoço.

Combinamos, via equipe do documentário, de nos encontrar na esquina da Paulista com a rua Pamplona mas foi uma tentativa de amadores. Qualquer um que já correu a São Silvestre sabe que haveria tamanha aglomeração que seria impossível se deslocar, quanto mais achar alguém. Eu bem que tentei, mas a cada passo era preciso empurrar homens aranhas, papais noéis, um sósia do Tiririca (super aplaudido), vários chapolins, chaves, estátuas vivas, um Ayrton Senna e até um homem-touro, com chifres de verdade. Esse eu não ia querer atrás de mim. Vai que ele tropeça? E ele ainda dizia para todos que olhavam e riam: “Tá rindo do chifre? Você ainda vai ter um!”

Em meio àquela massa suada (muitos tinham feito aquecimento) que se comprimia a uma média de 15 pessoas por metro quadrado, não havia chances de encontrar meu inimigo. Nosso desafio tinha ido por água abaixo. Depois da corrida, descobrimos que o José Roberto estava há uns cem metros (ou duas mil pessoas) na minha frente. Era só gritar.

Conformado, tentava chegar um pouco mais a frente, já que cada pessoa que ultrapassasse agora seria um a menos para ultrapassar durante a prova. E cada centímetro adiante significava umas dez pessoas a menos.

A corrida estava prestes a começar e eu havia estabelecido três metas:

1)     Não parar de correr. Andar seria uma derrota.

2)     Fazer a prova em menos de 90 minutos.

3)     Chegar à frente do José Roberto.

Ok, ok, chegar à frente do José Roberto era o mais importante. Ao todo eram 21 mil corredores e eu não me importaria em ser o 20.999, desde que o sacana fosse o 21 mil. Tudo para não ler o texto sacana no blog. Após a tentativa frustrada de encontrar meu arqui rival, ainda estabeleci uma quarta meta que era não ser ultrapassado por nenhum corredor com fantasia ridícula.

Em meio à multidão, você só percebe que foi dada a largada porque começa uma gritaria. Dificilmente consegue-se correr antes de passar pelo tapete eletrônico que ativa o chip que cada corredor leva consigo. Dois minutos de passar pelo tal tapete (e meu tempo começar a valer), eu já estava correndo, ao contrário da lenda que corre (com pernas curtas), segundo a qual, na avenida Paulista, só se consegue andar.

A emoção é indescritível. Comecei a rir sozinho de alegria. Finalmente eu estava ali, correndo a mesma prova que o Marílson e alguns dos melhores quenianos do mundo. Ok, eles estavam bem lá na frente, mas quem se importa? Sei exatamente o que deve ter sentido o Bruno Senna ao largar no último lugar na sua primeira corrida de Fórmula 1.

Como a rua Consolação é só descida, continuei sorrindo pelos três primeiros quilômetros. Mas bastou pegar a subida da rampa de acesso do minhocão, lá pelo km 3 para cair a ficha de que a coisa não era brinquedo e, se eu continuasse sorrindo, não ia chegar nem na metade. Comecei a dosar as energias e respirar como qualquer corredor amador que se preze. Ou seja, diante do Minhocão, vi que a coisa era séria.

Passou o Minhocão, chegou o belo e descuidado centro velho de São Paulo.

Alguma coisa aconteceu no meu coração quando eu cruzei a Ipiranga e a avenida São João. Faltou ar, parecia ser um princípio de enfarte. Mas tomei um pouco da água que trazia comigo e fui em frente. Estava decidido a cruzar a linha de chegada, nem que fosse no helicóptero do Incor.

Lá pelo km 10 eu já havia ultrapassado um sem número (bom, pensando bem, todos tinham um número no peito) de fantasias, incluindo um romano, uma estátua viva e um maratonista com coroa de louros levando o que deveria ser uma tocha olímpica. Foi quando vi pouco a frente o Ayrton Senna. O sujeito estava de macacão, capacete e tudo. Lembrei da minha quarta meta, engatei a quinta marcha e fui em seu encalço. Ultrapassei-o dois minutos depois e juro que ouvi a narração do Galvão Bueno “Marrrcelo Lyra ultrapaaaaaaassa Ayrton!!!!” Ok, ok, o sujeito estava de macacão e capacete, devia estar com um calor danado. Mas que eu passei, passei. E deixei O Senna para trás.

O mundo da fantasia daria o troco a seguir, pois um sujeito fantasiado de Chapolin (com macacão e antenas), me ultrapassou. Acho que ainda ouvi um “Me sigam os bons!” Indignado, engatei a sexta marcha e fui em seu encalço. Acompanhei-o por uns dois minutos, mas não agüentei seu ritmo. O Chapolin era realmente bom.

Algumas pessoas ficavam nas portas das suas casas com mangueiras. Era só abrir os braços como que pedindo e te davam um providencial e refrescante jato d’água. Obrigado a todos!

A essa altura já estava lá pelo km 10 ou 11. Quando passei pelo antigo Mappin, lembrei do antigo slogan “Mappin, venha correndo Mappin”. Pois é, vim correndo, Mappin. Depois veio o Viaduto do Chá. O que eu não daria por um bom chá mate e uma poltrona! Ao fundo, vi aquele que é um dos meus cartões postais preferido da cidade, o viaduto Santa Ifigênia, que o Adoniram Barbosa imortalizou em música. Rendi minhas homenagens: juntei o que restava de fôlego para cantarolar um trechinho “Venha ver Eugênia… Como ficou bonito… O viaduto Sta Ifigênia”.

Quando chegou o km 12, vi o início da subida da Brigadeiro. Meus pés e os joelhos doíam, assim como as batatas da perna. Sinceramente, achei que ia desistir. Meu maior inimigo era eu mesmo. Estava com o celular e resolvi sacar e ligar a câmera filmadora dele, para registrar o momento da desistência. Pensei “Quem bom que o José Roberto não está por perto para assistir minha derrota”. Mal eu sabia que, pelas nossas contas posteriores, eu devia estar passando por ele naquele exato momento. Mas estava tão exausto que não conseguiria ver nem a Gisele Bunchen de biquíni. O link para as imagens do meu celular no Youtube é esse aqui http://www.youtube.com/watch?v=sqQ9LEcu12M

Um cara passou por mim me sacaneando, bem no momento em que eu dizia para a câmera “Até agora não parei, mas acho que vou desistir”. Ele ouviu e disse: “Parou sim que eu vi!” Isso me deu um ânimo extra: “Agora é que eu não desisto”. Até consegui conversar com o cara, que estava na sua segunda S. Silvestre, tinha 37 anos e se chamava Márcio Preti, veterano corredor de diversas corridas de 10km.

Quando vi, já estava quase no final da subida. “Vai dar!”. Aguentei firme, mais gente começou a me apoiar. Umas meninas lindas começaram a gritar meu nome e achei que era miragem. Depois lembrei que abaixo do número do peito tinha meu nome, elas apenas leram. Foi um belo estímulo.

Quando cheguei na avenida Paulista, do nada parecia que eu voava! Corria leve e veloz. Achei até que tinha morrido e minha alma tinha abandonado o corpo. Na verdade, descobri uma coisa que ninguém nunca tinha me falado sobre a São Silvestre: quando a subida acaba e você começa a correr no plano, a sensação é que estamos uns vinte quilos mais leves. Comecei a ir mais rápido e vi a reta de chegada. “Vai dar! Vou conseguir!” Voltei a rir sozinho. Cruzei a linha de chegada inteiro e sorrindo, uma emoção incrível! Ainda não acredito.

Dois metros adiante um cara tinha desmaiado e era socorrido por paramédicos e alguns atletas. Olhei preocupado, pois poderia ser o José Roberto. Alívio, não era. Alívio número dois, notei que, na maca, ele tomava água e parecia estar bem, só exausto.

Completei a prova em exatos 88 minutos, ou seja, se o Marílson tivesse dado duas voltas, não me alcançaria. Achei que não fui nada mal, afinal ele treina todo dia e recebe para isso. De quebra, dez minutos à frente do arqui rival. Cumpri todas as minhas metas exceto o maldito Chapolin Colorado. Ano que vem ele não me escapa!