Reflexões quase sérias sobre a vida e a morte
Torero
(No “Velharias” de hoje, um texto em que eu devia estar meio macambúzio)
Numa tarde em que não tinha nada que fazer, comecei a pensar na relação que o esporte tem com a nossa vida.
Como a maioria, achava que essa relação se restringia às aulas de educação física e àquele curioso encontro de barrigudos nos fins-de-semana, que os otimistas chamam de futebol.
Mas eu estava errado. Sim, eu estava. O esporte está presente em cada mísero momento de nossa existência.
Para começo de conversa, nascemos em decorrência de algo que lembra bastante um esporte. Claro que há controvérsias.
Os escritores de Sabrina, por exemplo, descreveriam tal cena assim: “E então eles deitaram-se sobre lençóis de seda, tendo ao fundo o brilho gentil da lua prateada, vivendo intensamente cada segundo daquele instante em que não eram mais Conrad e Jane, mas um novo e único ser, que talvez pudesse ser chamado de…amor!”
Bem, não quero que pensem que sou grotesco, mas, olhadas as coisas com frieza, a situação parece-se mais com uma luta greco-romana.
Porém se há alguma dúvida nesse ponto, já no seguinte o paralelo é perfeito.
Feito o hole-in-one digno do mais genial golfista, nossa vida começa com nada mais, nada menos que uma corrida: a corrida dos espermatozóides, nossa primeira e mais importante competição, a qual, se não vencêssemos, não participaríamos de nenhuma outra.
Mal nascemos e já participamos de concursos de beleza com nossas mães nos comparando com outras crianças, depois vêm as disputas de inteligência para ver quem aprende a falar primeiro e por fim a ginástica rítmica, onde ganha quem consegue ficar de pé.
Passado esse tempo, começamos a nos interessar por outras competições.
Vêm os papagaios, as bolinhas de gude, os piões e, para as crianças mais modernas, os videogames.
Creio que continuaríamos brincando com joysticks ao longo de toda a nossa vida se pudéssemos, mas um dia nossos pais nos vêm dizer que aquilo pode fazer mal a vista e nos obrigam a praticar os esportes tradicionais.
Aí somos introduzidos ao mundo do futebol, do basquete, do judô, do vôlei, da ginástica olímpica e da natação.
Esse período mais ativo costuma prolongar-se dos 10 aos 18 anos, período que corresponde também ao da descoberta sexual, esse, sim, um esporte radical, cheio de perigos e emoções fortes.
Então vem a fase do trabalho e somos levados a exercitar outras habilidades esportivas.
A escalada social é mais difícil que alpinismo, sobreviver com um salário mínimo é uma corrida de obstáculos e a competitividade do mercado faz com que qualquer ringue de vale-tudo pareça mais um berçário.
E se você já enjoou de tanto esporte, lembre-se que ainda há o casamento, onde temos que ter a paciência de um enxadrista, a dissimulação de um jogador de pôquer, e o molejo de um corredor de marcha.
Assim corre nossa vã existência até que, finalmente, chegamos ao momento de passar para o outro lado do mistério.
É o fim de uma terrível queda de braço com a morte, luta que, no fim, sempre perdemos.
O que nos faz pensar de que adianta ter ganho aquela primeira corrida.