Parabéns!
Torero
No dia do seu aniversário, o Santos ganhou, e bem, do Cerro Porteño. Para comemorar, posto aqui um texto antigo, na verdade um email que recebi no aniversário do clube em 2002, alguns meses antes do Santos ganhar o Brasileiro daquele ano.
Um aniversário infernal
Recebi por esses dias um misterioso e-mail escrito em letras vermelhas. O remetente pedia que eu colocasse seu texto nesta coluna. Num primeiro momento decidi não atendê-lo, mas, quando li seu endereço virtual, julguei ser mais prudente ceder meu espaço. Eis o texto:
“Caro colunista, gostaria muito que o senhor publicasse esta carta. E nem pense em negar-me este pedido. Pelo que você tem feito aí em cima, sei que vamos nos encontrar mais cedo ou mais tarde aqui em meus domínios, e você não gostaria de me ver de mau humor. Quando estou bravo, solto fogo pelo nariz. E isso não é uma metáfora.
O melhor seria que minha carta saísse no domingo, dia 14, mas como sei que sua coluna só sai às terças e sextas, fiquemos com a sexta, mais próxima do aniversário do meu time, o Santos.
Imagino que, ao ler a linha acima, você deve ter dito: “Mas como pode o demônio gostar de um time chamado Santos?”.
E eu respondo ao previsível amigo: “Ora, não é porque sou um anjo caído que deixo de ser um anjo e, na condição de anjo, não poderia torcer para outro time”.
É bem verdade que aí em cima me associam ao América carioca. Realmente admito que tenho simpatia por esse time, mas, torcer por ele, convenhamos, já é comer o pão que eu amassei.
Aliás, é muito lógico que eu torça para o Santos. Não houve time que mais tenha infernizado as defesas rivais. Você não imagina como eu ficava envaidecido ao ouvir os adversários dizerem: “Esse Santos é um time do capeta!”.
Poucos sabem, mas eu, o Anhangá, o Beiçudo, o Cão Tinhoso, o Jurupari, o Maligno, o Rabão, o Sapucaio, o Tisnado, estive atrás de muitos daqueles gols endiabrados, de muitas daquelas jogadas demoníacas, de muitas vitórias diabólicas dos anos 60.
E aproveito a ocasião para contar-lhe um segredo sobre aquela época de glórias. Certa vez, em 1954, eu estava sossegado tomando uma sauna seca quando fui chamado por um dirigente santista -não adianta, não revelarei nomes. Esse sujeito não aguentava mais ser roubado pelas arbitragens e perder dos times da capital em condições suspeitas e me propôs trocar sua alma por uns campeonatos. Eu cocei meu cavanhaque com o rabo e disse: “Acho que posso fazer alguma coisa”.
E fiz! Ou você acha que foi coincidência o Pelé jogar justo no Santos. Isso sem falar no resto da legião: Coutinho, Pagão, Pepe, Dorval, Zito, Toninho Guerreiro, Lima, Gilmar…
Aquele esquadrão que brilhou por exatos 20 anos e fez o mundo se curvar ante o seu poder. Porém, como, por princípio ético e convicção moral, nunca faço nada de graça, que o diga o doutor Fausto. O Santos está tendo que passar por um período de relativa amargura. Sou um admirador do time, mas também sou um profissional e não posso deixar de cobrar meus devedores. Isso pode parecer triste para alguns de vocês, mas explica muita coisa, não é?
Mas não quero terminar essa carta sem uma boa notícia de aniversário. Sendo assim, aviso-lhe faltam poucas prestações para que o Santos resgate sua dívida e volte ser um vencedor. Aí, com mil eus!, voltarei a ser mais um torcedor aqui das profundezas, um torcedor que, como você e como tantos outros, quer apenas ver o Santos sendo campeão.
É tudo. Aceite, por favor, um caloroso abraço deste seu futuro anfitrião, Lúcifer”.